O telefonema do além

O dia tinha começado muito bem, já eram dez da manhã e nada errado tinha acontecido e vale lembrar que o dia começa efetivamente às oito horas.
Cada qual cuidava de seus afazeres e todos estavam muito ocupados.
Para situar, o escritório é dividido em três ambientes: o balcão que fica de frente a porta de entrada onde trabalham sempre dois atendentes.
A área de trabalho efetivo, separada do balcão por uma divisória de vidros canelados e tem a aparência de um ‘aquário’. É onde ficam as mesas, os computadores.
E o mezanino onde funciona uma corretora de seguros.

Acabavam de chegar os primeiro clientes do dia: um casal que desembarcara de um fusca verde água e um senhor que viera a pé mesmo.
Dentro do aquário toca um dos telefones e um dos chefes que estava desocupado atende.
-Alô? Sim é daqui sim... – atende ao telefone sem usar o texto padrão: o nome do estabelecimento e a saudação que melhor cabe àquela parte do dia.
- Azul? Fusca? Sim... Tem sim quem quer falar com ele? (...) Um só minuto que vou levar o telefone até ele.

Ao que parecia uma mulher ligara para tentar falar com alguém - seu marido provavelmente - que estaria por lá naquela hora.
E tinha dado a sorte.

Ao chegar à porta do ‘aquário’ lembrou-se que tinha algo a fazer na capital, avisou que estava indo naquela hora e que não demoraria a voltar.
De passagem pelo balcão olhou para os clientes e como o casal estava de mãos dadas deduziu que seria então o outro senhor.
Nem perguntou, apenas virou-se para o cliente e disse: “-Sua esposa esta ao telefone e quer falar com o senhor.” - e para o funcionário que estava atendendo: “-Vou até o bairro da Lapa, não demoro.”.
Entrou em seu carro, manobrou e sumiu em poucos segundos.

O atendente então notou que o senhor que recebera o telefone sem fio ainda não tinha atendido, nem dito um simples alô. Estava pálido e com a respiração ofegante.
-O senhor está bem?  - perguntou de forma retórica já que visivelmente ele não estava. Pega o telefone das mãos do cliente ao mesmo tempo em que o ajuda a se sentar.
O ocorrido chamou a atenção de todo mundo.
Correram para lhe pegar um copo com água, outro trouxe o ventilador para perto e a mulher que havia descido do fusca quis saber o que acontecera.

O funcionário que ainda estava com o aparelho nas mãos, ouvindo os chamados insistentes da pessoa do outro lado resolveu atender:
-Alô? Quem fala? – disse a voz ao telefone - Meu marido está ai ainda? Disseram que ele ia atender ao telefone e ta demorando, vai acabar os créditos...
-Mas senhora quem é seu marido? – pergunta ele.
-É Joaquim. Deve estar ai já, foi num fusca azul bem clarinho...
Então ele olhou para fora e viu que o fusca era verde e não azul e que o seu chefe havia se confundido.
-Olha, sinto muito, mas seu esposo ainda não chegou aqui não... Foi engano da parte do outro rapaz, desculpe.
-Tudo bem... Se ele chegar, é Joaquim o nome, pede pra ele ligar pra mulher dele, no celular. Tá bom?
-Peço sim... - e desliga o telefone voltando sua atenção para o senhor que já se recuperava.
-Menino! Fiquei realmente assustado agora... – diz ele - Minha esposa faleceu já pra mais de cinco anos. Que brincadeira mais sem graça.

Depois, bem mais tarde todos ficaram pensando em uma forma de sacanear o chefe.
Rir um pouco dele quando soubesse da situação que causou.
Eis que ele chega cansado e com cara de poucos amigos.
- Estes trens estão cada dia piores. Atrasados e sempre cheios!
- Ué, mas porque você voltou de trem? Quebrou o carro?
-Carro? Como assim? Eu fui de carro?
-Foi...
-Vixe... Danou-se! Deixei o carro no estacionamento e esqueci dele... Voltei de trem.
Todos acharam melhor nem tocar no outro assunto.
Agora era melhor rir deste novo...

Comentários

Anderson disse…
kkk, bora comprar ômega 3 pra esse cidadão.
Jaime Boueri disse…
Tive um amigo que, há algumas semanas, foi de carro para a faculdade e voltou para casa de carona com um amigo...

Quando chegou em casa, o pai perguntou sobre o carro (dele, do pai) com o qual meu amigo havia ido trabalhar.

Aí que ele lembrou que... ESQUECEU DO CARRO NA FACULDADE! E teve de voltar lá para buscar.

História verídica. Inacreditável, mas verídica. Eu ri DEMAIS!
Vander Romanini disse…
É... o pior é que existe isso!!!
Já esqueci o Velho Rick num Estúdio!!
E tive que pagar 10 contos de gasolina pro cara me levar de volta!!!
Rubs disse…
Bem, embora eu absolutamente não seja anão, sempre defendo a idéia de que dos males é preferível o menor.
Soube de um sujeito que não esqueceu de baixar a capota do conversível no estacionamento do shopping, mas esqueceu a esposa com as compras na mão...
Abs.
Manu disse…
Bem, nunca passei por essas situações estranhas, ou mesmo de esquecer coisas importantes. Dizem que é stress... :D

Abs!
Marcelonso disse…
Groo,

Tenho um amigo que foi ao shopping fazer compras e ao voltar não achou o carro. Ele acionou a policia e fez o maior salseiro, achando que haviam roubado o carro. Tempos depois o segurança apareceu dizendo que encontraram o carro, estava estacionado no outro pavimento. O maluco esqueceu onde tinha estacionado...acontece!

abs

Magnum disse…
Hahaha, eu quando não acho meu carro não entro em pânico, sei que a maior probabilidade é que seja a minha memória falhando como sempre. E de fato.

Mas lá pro começo da história eu poderia jurar que o final seria outro. A esposa do cara já teria morrido sim, mas quando ele atendesse o telefone e fosse descobrindo o engano, perceberia que se tratava sim do cara ao lado, que estaria com uma amante!

Não pensaste nesta possibilidade ou achou isto muito chavão?

De qualquer forma, texto genialmente escrito como sempre!