Nota do Busão - é que deu saudade.

Há mais de uma no que eu não uso mais o serviço das linhas de ônibus de minha cidade.
Trabalho perto de casa, em uma distancia que pode ser coberta a pé sem maiores dificuldades e nem cansaço, porém nestes dias pós pleito, em que uma folga no trabalho se faz presente – na verdade é emenda do dia de finados – eu resolvi ir rever alguns camaradas.
Fiquei no ponto uns vinte minutos esperando passar o busão pilotado por Amaral, vulgo Zé Pequeno pela semelhança com o personagem de Cidade de Deus.
Quando ele aparece, já não faz a linha que eu costumava usar, porém, como eu não vou para lugar nenhum mesmo embarco vamos que vamos.
-E ai Zé! Cadê o cobrador com cara de tonto?
-Agora é fiscal. Trabalha no final do 103.
-Mas como ele tá?
-Com a mesma cara de tonto...
-E o Gente Boa? – pergunto me referindo ao morador de rua que curtia F1 nas Tv´s das Casas Bahia.
-Cê não soube?
-Não... – a pergunta já me deu calafrios, nunca esperei nada de bom vindo de um “Cê não soube?”.
-A família dele veio buscar... Ele ficou um tempo internado, mas agora já está bem, trabalha e tudo...
Fiquei aliviado.
-Sabe aquele cara que entrou com um cachorro e eu não deixei pagar passagem?
-Lembro... Aquele que disse que cego era o cachorro.
-Este mesmo... Era cabo eleitoral do Serra aqui em Franco.
-Por que isto não me espanta?
Demos boas risadas lembrando de quando ele atropelou caixas de melancia na avenida, ou de quando ele engoliu lingüiças de boteco para poder tomar remédios contra gastrite.
Pouco antes de descer do circular, já de volta ao ponto onde embarquei Amaral me pergunta pelo GP Brasil deste ano.
-Cara... Eu to achando que vai ser uma corrida bem legal... Pena que o Alonso pode levar o titulo...
Amaral, tomado de sua porção Zé Pequeno freia o coletivo com força desproporcional, olha pelo espelhinho com o qual controla a saída dos passageiros pela porta traseira e diz baixinho.
-Tá vendo aquele senhor ali sentado logo depois da catraca?
-Sim... O que tem…
-Ele é espanhol... Muito gente boa, grande camarada, mas é torcedor do Alonso até a medula...
-E?
-Ouve só... – e diz em voz alta para que o passageiro ouça – O Alonso vai se estabacar na subida do café de novo, como em 2003!
De seu acento o senhor espanhol sorri, mostra o dedo médio e comenta:
-Pode ser... Se você lembrar direito, naquela corrida ele ainda chegou em terceiro, já tá bom...
-Um dia eu acelero na hora que ele estiver entrando ou saindo...
E do senhor espanhol:
Acelera nada... Cê é igual ao Massa... Sabe que quem manda somos nós espanhóis, não importa se piloto ou passageiro.
O chato é saber que no fundo bem no fundo, o homem tem razão...