Celão entra no bar do Canário com uma expressão mista de cansaço e frustração. Pede uma tubaína. -Tubaína? Ué, Celão? Tá doente?
-Não... To desempregado, e sabe como é... Desempregado tomar cerveja numa quarta às duas da tarde é meio esquisito... Não acha?
Canário não achava, mas cada qual sabe de sua ética.
-Ainda não arrumou nada? – pergunta o botequeiro.
-Nada, só enviando currículo, fazendo entrevista... Mas chamar que é bom, nada.
-Entendo... Tá vindo de alguma entrevista?
-Não, não... Do cartório.
-Cartório?
-É... Fui ver quanto fica pra fazer uma declaração de união estável, mas pelo preço que pediram no negócio, melhor casar...
-E pra que você precisa desta declaração?
-Pra poder ser incluído no plano de saúde da Josie...
Celão que era um negrão de quase dois metros de altura e pelo menos cem quilos, vivia maritalmente com Josie, uma cearense de um metro e meio, havia pelo menos sete anos, nunca sequer cogitaram formalizar nada. Diziam não crer em papeis, contratos. Só no amor.
Mas agora viam necessidade nos tais papeis.
-Se fossemos casados era só apresentar a cópia da certidão, mas como a gente não é... Entendeu? – explicou.
-Entendi... E o preço da tal declaração é alto? – quis saber Canário.
-É... Quase o mesmo do casamento, e o pior, ia precisar de uma por ano pra renovar o contrato com o plano de saúde. Melhor casar.
-Então casa!
-Agora? Estou desempregado poxa... Devia ter feito isto quando podia, mas como eu ia saber?
-É... – concorda canário servindo a tubaína – Mas acho que tem um jeito!
-Tem? – quis saber.
-Tem... Lembra do Andrade?
-O professor?
-É! Ele mesmo... Cê pode trocar uma idéia com ele. Ele é tio do dono do cartório, pode arrumar pra você o casamento na faixa, só apresentando uma declaração de pobreza. E cara, sem querer ofender, no momento, é a realidade, não? Não é vergonha nenhuma. A certidão sai logo, é igual as outras... No dia da cerimônia ninguém vai saber de nada, é como se fosse um casório no civil normal.
-Hum... Eu não tenho problemas em declarar pobreza não, não sou orgulhoso.
-Então... É só falar com o Andrade pô... Daqui a pouco ele ta aqui.
-Bom... Eu disse que não tenho orgulho e tal, mas sabe... O Andrade não vai muito com a minha cara... Na verdade, eu até mereço. Vendi um Uno pra ele, com a documentação toda ferrada... E depois dei uma sumida. Já encontrei com ele umas vezes e ele não falou nada, mas fico constrangido agora de pedir algo.
-Quer que eu fale com ele? Deixa seu telefone, eu conto o caso, tenho certeza que ele ajuda. Depois de te ligo e você vai lá ao cartório. Pode ser?
-Boa, pode sim. Eu vou ficar imensamente agradecido.
Celão paga a tubaína, aperta calorosamente a mão de Canário e sai, feliz da vida.
Alguns minutos depois Andrade chega acompanhado de Anízio, Márvio e Dito, o ex-prefeito.
Canário conta o caso e Andrade ouve atentamente, depois abre um sorriso e diz que tudo bem.
-Pode ligar pro Celão e mandar ele ir lá. Tá resolvido.
Canário então pega o telefone e liga para Celão, que ainda deve estar por perto, seria só fazer meia volta e ir ao cartório. Ao dar o recado, desliga o telefone diz.
-Que bom que você não guardou ressentimentos Andrade... O Celão tá precisando.
-É... Não guardei...
-Mas você não vai ligar lá?
-Vou, claro... Me empresta o telefone ai...
Canário estica o fio do aparelho e Andrade faz a ligação.
-Alô? Castro? Sou eu seu tio Andrade... Pois é. To te ligando pra te pedir um favor. Pode ser? (...) Não, não é pra mim, é para um amigo. (...) O Celão. Cê sabe quem é... (...) Pois é, ele precisa de um papel pra por nos documentos do plano de saúde, mas achou meio caro ai resolveu usar declaração de pobreza, manja? (...) É... União civil entre pessoas do mesmo sexo... Deixa pronto ai com aquela documentação dele que eu te levei quando ele me vendeu o Uno... (...) É... E o companheiro se chama José! (...) Sabia que podia contar com você... Brigado! – e desliga o telefone.
-Pronto! – diz sorrindo enquanto todos se olham sem acreditar.
-Ainda bem que tu não guarda rancor... – diz Canário.
-Não guardo mesmo... E pode tirar a mão deste telefone ai... Deixa ele ir lá tranquilo...
-Não... To desempregado, e sabe como é... Desempregado tomar cerveja numa quarta às duas da tarde é meio esquisito... Não acha?
Canário não achava, mas cada qual sabe de sua ética.
-Ainda não arrumou nada? – pergunta o botequeiro.
-Nada, só enviando currículo, fazendo entrevista... Mas chamar que é bom, nada.
-Entendo... Tá vindo de alguma entrevista?
-Não, não... Do cartório.
-Cartório?
-É... Fui ver quanto fica pra fazer uma declaração de união estável, mas pelo preço que pediram no negócio, melhor casar...
-E pra que você precisa desta declaração?
-Pra poder ser incluído no plano de saúde da Josie...
Celão que era um negrão de quase dois metros de altura e pelo menos cem quilos, vivia maritalmente com Josie, uma cearense de um metro e meio, havia pelo menos sete anos, nunca sequer cogitaram formalizar nada. Diziam não crer em papeis, contratos. Só no amor.
Mas agora viam necessidade nos tais papeis.
-Se fossemos casados era só apresentar a cópia da certidão, mas como a gente não é... Entendeu? – explicou.
-Entendi... E o preço da tal declaração é alto? – quis saber Canário.
-É... Quase o mesmo do casamento, e o pior, ia precisar de uma por ano pra renovar o contrato com o plano de saúde. Melhor casar.
-Então casa!
-Agora? Estou desempregado poxa... Devia ter feito isto quando podia, mas como eu ia saber?
-É... – concorda canário servindo a tubaína – Mas acho que tem um jeito!
-Tem? – quis saber.
-Tem... Lembra do Andrade?
-O professor?
-É! Ele mesmo... Cê pode trocar uma idéia com ele. Ele é tio do dono do cartório, pode arrumar pra você o casamento na faixa, só apresentando uma declaração de pobreza. E cara, sem querer ofender, no momento, é a realidade, não? Não é vergonha nenhuma. A certidão sai logo, é igual as outras... No dia da cerimônia ninguém vai saber de nada, é como se fosse um casório no civil normal.
-Hum... Eu não tenho problemas em declarar pobreza não, não sou orgulhoso.
-Então... É só falar com o Andrade pô... Daqui a pouco ele ta aqui.
-Bom... Eu disse que não tenho orgulho e tal, mas sabe... O Andrade não vai muito com a minha cara... Na verdade, eu até mereço. Vendi um Uno pra ele, com a documentação toda ferrada... E depois dei uma sumida. Já encontrei com ele umas vezes e ele não falou nada, mas fico constrangido agora de pedir algo.
-Quer que eu fale com ele? Deixa seu telefone, eu conto o caso, tenho certeza que ele ajuda. Depois de te ligo e você vai lá ao cartório. Pode ser?
-Boa, pode sim. Eu vou ficar imensamente agradecido.
Celão paga a tubaína, aperta calorosamente a mão de Canário e sai, feliz da vida.
Alguns minutos depois Andrade chega acompanhado de Anízio, Márvio e Dito, o ex-prefeito.
Canário conta o caso e Andrade ouve atentamente, depois abre um sorriso e diz que tudo bem.
-Pode ligar pro Celão e mandar ele ir lá. Tá resolvido.
Canário então pega o telefone e liga para Celão, que ainda deve estar por perto, seria só fazer meia volta e ir ao cartório. Ao dar o recado, desliga o telefone diz.
-Que bom que você não guardou ressentimentos Andrade... O Celão tá precisando.
-É... Não guardei...
-Mas você não vai ligar lá?
-Vou, claro... Me empresta o telefone ai...
Canário estica o fio do aparelho e Andrade faz a ligação.
-Alô? Castro? Sou eu seu tio Andrade... Pois é. To te ligando pra te pedir um favor. Pode ser? (...) Não, não é pra mim, é para um amigo. (...) O Celão. Cê sabe quem é... (...) Pois é, ele precisa de um papel pra por nos documentos do plano de saúde, mas achou meio caro ai resolveu usar declaração de pobreza, manja? (...) É... União civil entre pessoas do mesmo sexo... Deixa pronto ai com aquela documentação dele que eu te levei quando ele me vendeu o Uno... (...) É... E o companheiro se chama José! (...) Sabia que podia contar com você... Brigado! – e desliga o telefone.
-Pronto! – diz sorrindo enquanto todos se olham sem acreditar.
-Ainda bem que tu não guarda rancor... – diz Canário.
-Não guardo mesmo... E pode tirar a mão deste telefone ai... Deixa ele ir lá tranquilo...
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Comentários
Esse não guarda rancor nenhum...hehehe
Fiquei imaginando a cara do negão quando viu o documento...
abs
Ainda bem que temos um sujeito com a sua imensa inteligencia para esclarecer tudo.
Porque vc não vai sifu....
Peço desculpas, mas esse MC é um sujeito sem noção, tem horas que esse chato passa das medidas.
abs