Desculpas? Quem?

O ar pesado na sala era quase palpável.
O mobiliário lúgubre fazia do ambiente, embora amplo, claustrofóbico.
A presença daqueles homens vestidos de terno preto e óculos escuros atrás da caldeira com espaldar alto, provavelmente do século XIX, cumpria fielmente seu papel: amedrontar.
Os quadros eram o que menos metiam medo, porem, havia um só rosto retratado em meio a centenas de pinturas com carros vermelhos.
Mas aquele único quadro tinha olhos penetrantes, como se vivos fossem: Il Comendatore.

Mas ele viera até ali com o firme propósito de exigir que lhe pedissem desculpas.
Sentado em um banco de simplicidade espartana (nem apoio para os braços tinha), já estava ali há boas duas horas desconfortavelmente observado pelos homens de terno.
Vez por outra procurava – discretamente – com os olhos algum volume suspeito sob os paletós.

Então, as portas da sala se abrem e um sujeito bem vestido, perfumado e com ar levemente aparvalhado entra por ela.
Ele senta-se à cadeira guardada pelos homens de terno e mira por longos minutos o homem sentado no banquinho.
Então começa a falar.

-Então você vem até a minha casa me pedir um favor?
-Não eu vim... Começa ele a falar, mas é interrompido pelo olhar ríspido dos homens de termo.
-Vem até aqui, não me traz um presente... E quer me pedir um favor? Não é uma ideia inteligente... Lembra-se de Guido?

O homem no banco se move para falar algo e novamente se cala ante os olhares.

-Guido era um bom homem. Pai de família... Mas não apertou um parafuso devidamente. A roda escapou e nosso bambino foi prejudicado. Logo após veio me pedir um favor... Guido não está mais entre nós... E Piero? Lembra-se de Piero? Torcedor do Napoli, homem orgulhoso, mas ousou me pedir um favor após apertar um botão que apagava umas luzinhas em um pirulito eletrônico. Liberou o carro antes da hora no pit e outro bambino nosso saiu levando uma mangueira em seu carro... Piero não está mais entre nós... Mas aposto que se lembra de Gilardino. Ah! O velho Gilardino... Estava conosco desde o tempo do Comendatore... (e todos olham para o quadro que parece sorrir ao ouvir-se citado) Seu único defeito era ser esquecido... Correu para um pitstop sem um dos pneus e deixou outro bambino nosso com apenas três rodas... Na semana seguinte veio me pedir um favor também e, curiosamente, não está mais entre nós...

O silêncio não era cortado nem pelas respirações.

-Mas o que você veio me pedir mesmo?

-Desculpas... EU vim pedir desculpas por ter recebido o dinheiro do contrato que o senhor tão generosamente quebrou alguns anos atrás. Desculpa. E se quiser quebrar de novo, juro que não vou receber um só centavo... Juro.

Comentários

Faltou o som no post, lembrou alguma cena do Poderoso Chefão....muito bom.
Vander Romanini disse…
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
Véi, consegui enxergar a sala e confesso que tava meio com ar de suspense até o pedido de desculpa!!!!!!
Excelente texto!!!! Parabéns!!
Anônimo disse…
Hahahaha muito boa!
Abração Felipe Corrêa Santa Maria-RS
Manu disse…
A sensação não foi nada agradável. Até o Poderoso Chefão seria mais fácil de encarar. ^^

Abs!
Não sei se essa pressão mafio-macarrônica funcionaria, se o nórdico tomasse umas vodkas antes...
ander010 disse…
kkk Como esse Ron é sacana.
José Coutinho disse…
Genial. Seria melhor roteirista que o Woody Allen em filmes sobre os bastidores da F1.