Há quem não goste do GP húngaro e é até fácil entender os motivos: pista sinuosa, de média velocidade, travada com pouquíssimos ou nenhum ponto de ultrapassagem e possibilidade quase inexistente de variação climática.
Porém, quando tem momentos emocionantes, estes são arrebatadores.
A ultrapassagem de Rubens Barrichello sobre Michael Schumacher em 2010.
O acidente de Felipe Massa com a mola em 2009.
A corrida fantástica de Damon Hill com uma Arrows em 1997.
A primeira vitória de Alonso colocando uma volta sobre nada mais que Michael Schumacher em 2003.
Porém, nenhum momento é mais icônico do que a ultrapassagem de Nelson Piquet sobre Ayrton Senna na primeira corrida húngara da era F1 (houve uma corrida naquele país em 1939).
O lance é tão fantástico que outro campeão mundial, Jackie Stewart, definiu dizendo que: “-Foi como fazer um looping com um Boeing 747!”
E foi este lance que me fez escrever um dos textos que mais tenho orgulho.
E é ele que segue.
O sol sempre escaldante do mês de agosto fustiga a cabeça do jovem Mika.
Sentado em uma arquibancada bem no fim da reta de largada, já quase dentro da curva ‘um’, vai assistir o GP da Hungria de F1 acompanhado de seu indefectível walkman e uma fita cassete do último álbum do Queen: ‘A kind of magic’.
Será o primeiro GP de F1 em seu país.
A pista é estreita, as freadas não são fortes e a única reta do circuito - onde Mika está instalado - não é grande o suficiente para que um motor se sobressaia a outro pela força de seus cavalos.
Poucos teriam coragem – ou loucura - para tentar, em condições normais de funcionamento, uma ultrapassagem.
Mika, entediado, já ouviu a fita cassete inteira ao menos umas três vezes.
Não se preocupa muito com a corrida. Não há ídolos locais neste esporte, e ainda por cima a primeira fila é formada por dois representantes de um longínquo país: o Brasil.
Mika entende pouco, quase nada de F1, está ali por ser exatamente o primeiro grande prêmio em seu país e isto já garante que será um evento histórico.
Os personagens – para Mika – são: um carro preto com piloto de capacete amarelo na pole position e um carro amarelo e branco de bico azul com um “6” branco pintado nele na segunda posição do grid.
Mika assiste à largada e vê o carro preto pular na ponta enquanto o de bico azul perde a posição para outro carro amarelo e branco de bico azul, este, porém enfeitado com um “5” vermelho...
O “5” vermelho não resiste às estocadas do número “6”, e poucas voltas depois perde a segunda posição.
O que se segue é uma perseguição monstruosa ao carro preto com piloto de capacete amarelo.
Mika procura em seu programa da corrida onde estão os nomes e os números dos carros e identifica: Preto, capacete amarelo: Senna.
Amarelo e branco com bico azul e número “6” branco: Piquet.
Amarelo e branco com bico azul e número “5” vermelho: Mansell.
Estes três e mais um francês narigudo de nome Alain Prost que pilotava um carro pintado em vermelho e branco são - segundo o programa da corrida - os quatro maiores pilotos em atividade neste ano e tudo indica que o título de 1986 não escapará a um deles.
Mas voltando a corrida que já vai pela décima terceira volta, o carro número “6” ultrapassa o carro preto e abre uma pequena vantagem. Não suficiente para que continue em primeiro depois da parada para troca de pneus que todos são obrigados a fazer.
Logo o carro do piloto de capacete amarelo volta à primeira posição tendo em seu encalço novamente o bico azul número “6”.
Já na volta cinquenta e quatro, meio que sem querer Mika levanta a cabeça e olha para a pista. Vê o carro de bico azul número “6” ultrapassando de forma forçada o carro preto.
O piloto pega o traçado de dentro, entre o carro a ser ultrapassado e o muro.
Ele - Mika - se levanta na arquibancada e prende a respiração por alguns instantes.
O carro número “6” ultrapassa o carro preto, mas não consegue fazer a curva de forma correta.
Perde o ponto de tangência e, completamente desequilibrado, perde novamente a posição para o piloto de capacete amarelo.
Dentro do carro de bico azul número “6” o piloto deve ter pensado: “-Pqp! Ele deve estar rindo muito de mim agora. Arrisquei à toa, mas não vai ficar assim!”.
Já de dentro do carro preto o piloto que devia estar rindo e dizendo para si mesmo: “Aqui não! Que não nasci para ser ultrapassado sem lutar... Vem de novo se for homem!”.
Mika do alto da arquibancada engole seco e pensa: “-São loucos estes homens!”.
Duas voltas se seguem sem que o piloto do carro número “6” tente passar.
Mika está ansioso pelos próximos movimentos.
O piloto de capacete amarelo parece se sentir confiante o bastante para achar que não será mais incomodado.
Já o piloto do carro “6” já não pensa mais. Age.
Na mesma reta, no mesmo ponto ele investe, mas desta vez põe o carro no lugar menos provável: o lado de fora encaixotando o piloto do carro preto entre ele e o muro.
Mika vê aquilo sem acreditar, sem respirar. O momento parecia suspenso.
O carro número “6” completa a ultrapassagem no último milímetro da pequena reta. Não tem como sustentar a posição. Não tem espaço para contornar a curva de maneira correta.
O carro preto certamente vai tomar a posição novamente.
Só que desta vez é diferente...
No walkman, Freddie Mercury canta com sua voz inconfundível... “It’s a kind of magic, magic... MAGIC “...
O carro de bico azul e número “6” retarda a freada até o limite do suportável, pra lá do “Deus me livre” e com um golpe no volante e extremo controle do carro ele desliza. Derrapa nas quatro rodas. Milímetros à frente do carro preto, que freia e se recolhe, humildemente...
“ -It’s a king of magic”. - Pensa Mika.
“-Oh! Meu Deus...” – Pensa Senna.
“-Atománocu! Te peguei, ri agora!”. – Grita de dentro carro Nelson Piquet, como se soube depois.
Um silencio monstruoso no autódromo, coisa rara. Só se ouve os motores dos carros.
Tudo parecia nem existir, só a imagem dos dois carros no fim da reta.
“-It’s a kind of magic..”. Continua cantando Freddie Mercury.
Mika se levanta e vai rumo à saída do autódromo. Já não importa quem vai ganhar a corrida. Seja qual for o resultado ao fim das 76 voltas, o grande vencedor daquela tarde foi o piloto do carro amarelo e branco de bico azul e com um número “6”.
Foi uma espécie de magia...
Porém, quando tem momentos emocionantes, estes são arrebatadores.
A ultrapassagem de Rubens Barrichello sobre Michael Schumacher em 2010.
O acidente de Felipe Massa com a mola em 2009.
A corrida fantástica de Damon Hill com uma Arrows em 1997.
A primeira vitória de Alonso colocando uma volta sobre nada mais que Michael Schumacher em 2003.
Porém, nenhum momento é mais icônico do que a ultrapassagem de Nelson Piquet sobre Ayrton Senna na primeira corrida húngara da era F1 (houve uma corrida naquele país em 1939).
O lance é tão fantástico que outro campeão mundial, Jackie Stewart, definiu dizendo que: “-Foi como fazer um looping com um Boeing 747!”
E foi este lance que me fez escrever um dos textos que mais tenho orgulho.
E é ele que segue.
A Kind of Magic
O sol sempre escaldante do mês de agosto fustiga a cabeça do jovem Mika.
Sentado em uma arquibancada bem no fim da reta de largada, já quase dentro da curva ‘um’, vai assistir o GP da Hungria de F1 acompanhado de seu indefectível walkman e uma fita cassete do último álbum do Queen: ‘A kind of magic’.
Será o primeiro GP de F1 em seu país.
A pista é estreita, as freadas não são fortes e a única reta do circuito - onde Mika está instalado - não é grande o suficiente para que um motor se sobressaia a outro pela força de seus cavalos.
Poucos teriam coragem – ou loucura - para tentar, em condições normais de funcionamento, uma ultrapassagem.
Mika, entediado, já ouviu a fita cassete inteira ao menos umas três vezes.
Não se preocupa muito com a corrida. Não há ídolos locais neste esporte, e ainda por cima a primeira fila é formada por dois representantes de um longínquo país: o Brasil.
Mika entende pouco, quase nada de F1, está ali por ser exatamente o primeiro grande prêmio em seu país e isto já garante que será um evento histórico.
Os personagens – para Mika – são: um carro preto com piloto de capacete amarelo na pole position e um carro amarelo e branco de bico azul com um “6” branco pintado nele na segunda posição do grid.
Mika assiste à largada e vê o carro preto pular na ponta enquanto o de bico azul perde a posição para outro carro amarelo e branco de bico azul, este, porém enfeitado com um “5” vermelho...
O “5” vermelho não resiste às estocadas do número “6”, e poucas voltas depois perde a segunda posição.
O que se segue é uma perseguição monstruosa ao carro preto com piloto de capacete amarelo.
Mika procura em seu programa da corrida onde estão os nomes e os números dos carros e identifica: Preto, capacete amarelo: Senna.
Amarelo e branco com bico azul e número “6” branco: Piquet.
Amarelo e branco com bico azul e número “5” vermelho: Mansell.
Estes três e mais um francês narigudo de nome Alain Prost que pilotava um carro pintado em vermelho e branco são - segundo o programa da corrida - os quatro maiores pilotos em atividade neste ano e tudo indica que o título de 1986 não escapará a um deles.
Mas voltando a corrida que já vai pela décima terceira volta, o carro número “6” ultrapassa o carro preto e abre uma pequena vantagem. Não suficiente para que continue em primeiro depois da parada para troca de pneus que todos são obrigados a fazer.
Logo o carro do piloto de capacete amarelo volta à primeira posição tendo em seu encalço novamente o bico azul número “6”.
Já na volta cinquenta e quatro, meio que sem querer Mika levanta a cabeça e olha para a pista. Vê o carro de bico azul número “6” ultrapassando de forma forçada o carro preto.
O piloto pega o traçado de dentro, entre o carro a ser ultrapassado e o muro.
Ele - Mika - se levanta na arquibancada e prende a respiração por alguns instantes.
O carro número “6” ultrapassa o carro preto, mas não consegue fazer a curva de forma correta.
Perde o ponto de tangência e, completamente desequilibrado, perde novamente a posição para o piloto de capacete amarelo.
Dentro do carro de bico azul número “6” o piloto deve ter pensado: “-Pqp! Ele deve estar rindo muito de mim agora. Arrisquei à toa, mas não vai ficar assim!”.
Já de dentro do carro preto o piloto que devia estar rindo e dizendo para si mesmo: “Aqui não! Que não nasci para ser ultrapassado sem lutar... Vem de novo se for homem!”.
Mika do alto da arquibancada engole seco e pensa: “-São loucos estes homens!”.
Duas voltas se seguem sem que o piloto do carro número “6” tente passar.
Mika está ansioso pelos próximos movimentos.
O piloto de capacete amarelo parece se sentir confiante o bastante para achar que não será mais incomodado.
Já o piloto do carro “6” já não pensa mais. Age.
Na mesma reta, no mesmo ponto ele investe, mas desta vez põe o carro no lugar menos provável: o lado de fora encaixotando o piloto do carro preto entre ele e o muro.
Mika vê aquilo sem acreditar, sem respirar. O momento parecia suspenso.
O carro número “6” completa a ultrapassagem no último milímetro da pequena reta. Não tem como sustentar a posição. Não tem espaço para contornar a curva de maneira correta.
O carro preto certamente vai tomar a posição novamente.
Só que desta vez é diferente...
No walkman, Freddie Mercury canta com sua voz inconfundível... “It’s a kind of magic, magic... MAGIC “...
O carro de bico azul e número “6” retarda a freada até o limite do suportável, pra lá do “Deus me livre” e com um golpe no volante e extremo controle do carro ele desliza. Derrapa nas quatro rodas. Milímetros à frente do carro preto, que freia e se recolhe, humildemente...
“ -It’s a king of magic”. - Pensa Mika.
“-Oh! Meu Deus...” – Pensa Senna.
“-Atománocu! Te peguei, ri agora!”. – Grita de dentro carro Nelson Piquet, como se soube depois.
Um silencio monstruoso no autódromo, coisa rara. Só se ouve os motores dos carros.
Tudo parecia nem existir, só a imagem dos dois carros no fim da reta.
“-It’s a kind of magic..”. Continua cantando Freddie Mercury.
Mika se levanta e vai rumo à saída do autódromo. Já não importa quem vai ganhar a corrida. Seja qual for o resultado ao fim das 76 voltas, o grande vencedor daquela tarde foi o piloto do carro amarelo e branco de bico azul e com um número “6”.
Foi uma espécie de magia...
Comentários
Eu gosto de Hungria, não tenho nada contra. Mas... Vamos ver. Pode ser que esse não seja do meu agrado hehehe...
Abs!
Mas já vou logo avisando: GP da Hungria é chato pacas !
Não ganha nem de Mônaco.
Boa tarde !
. Ah. E também gosto da Hungria. O GP só com laxante, já disse ? Lacto Purga. Mas aquela entrega prá Alemanha, em 1954... Pior que 7 a 1.
Goulash é gostoso.
. Pronto ! Primeira frase e já me venceu ! Tô dizendo, o homem veio com tudo no texto.
. Tô deixando... acha que ia cair na foto linda maravilhosa do meu maior ídolo ultrapassando aquele genial piloto do tãtãtã... tãtãtã galvânico ?
. Exageraaaado... Schummy chegou em oitavo. Kimi Vodka já estava lá ! Arrebatando coraçõeszinhos inocentes: 'Aaaaah, lindinho...', Oiqtetas. Elas ainda existem ? Vou lá um dia, faz 1 anos que não parece. Fui no Corradi. Na do Dragão, ela se fechou tanto, tanto, que não passa um ventinho.
Chegou em segundo o hoje segundão da Ferrada.
A rebimboca da parafuseta louca ! Dizem que foi depois daquilo que Zacarias perdeu segundos e contentou-se em ser segundo. Não acredito. Vivemos de comparações. Lauda, Piquet, Sen... Não, o último se foi.
O senhor disse... ultraloucagem ?
. Nuvolari ganhou em 1936. Tavalá.
. Com um 747 ? Humilde... Como um Saturno V ! Tudo bem, o Jackie era pilotaço. Eu ? Pilotinho.
Vamos ao texto mas, antes, digo, que a beleza está em toda a estratégia de Piquet que culminou na genial ultrapassagem. Diria ser a ultrapassagem a cereja do bolo. E ainda teve o dedinho, aquele, no meio da curva...
Só poderia restar um... Connor MacLeod ! Nome do meu cachorro, que se foi... snniiiifff, também, a kind of magic... só que sem cortar a cabeça. Umas são cortadas, a moda ainda perdura por aí.
Depois desta minha lembrança arrasadora, gostei, senhor Groo, do texto. Au.
. Mas, aos fatos. Hungahorroring era ainda pior ! Cruzes ! Poderia dizer que Drácula saiu da Romênia para criar aquele circuito. Só pode ser coisa dele !
Bom, o dono do capacete amarelo com listras verde e azul não era bobo e sabia que o GP era amplamente favorável para ele. Cheio de curvetas e retolhas horroríveis além de uma retão que o poderoso Renault EF15B 1.5 V6t mandava ver como qualquer porcaria Honda RA166E 1.5 V6t. Exagerei.
Vemos algo parecido, hoje. Dizem que Riccardão Sorriso dominou os treinos... Voltando.
Foi o que ele fez na corrida. Entrava naquele torturante kartódromo de curvinhas fechadas e retinhas e ficava manezando de sacanagi na frente do limão azedo que já deveria estar estragado de tanta raiva ! Chegava na reta, motorzão com motorzão, a Lotus ficava na frente para chegar na curva que antecedia ao kartódromo pentelho. Não contava, o Saudoso Tiozão, com o astucioso dono do capacete da gota aerodinâmica vermelha( com listras vermelhas também, deixa de ser chato !) já espumando suco de limão azedo estragado pelos ouvidos ! Aliás, o capacete do Piquet é fantástico.
E assim veio mãe de todas as ultrapassagens geniais !
Pensem, meus queridos iniamigos e iniamigas. Tinha errado a primeira tentativa. Se fosse Vettelino, pararia numa placa DHL qualquer. Se fosse Verstappadinho, matava um fiscal. Se fosse GH-4, não tentava. O moleque é malandro. Na segunda tentativa piqueteana, um show !
Entenderam ? Não ? Vão ao You Tube, chatos ! E assistam a corrida inteira !
M.C.