Um pouco de cabotinagem...

O texto foi pedido a mim pela amiga Ingryd Lamas para figurar na edição de Abril da revista Per Voi na qual ela trabalha. Pode-se ler visitando o site http://revistapervoi.com.br/ onde se encontra a edição que está nas bancas ou aqui agora. Fica aqui meu agradecimento a Ingryd pela lembrança do meu nome para colaborar com a edição e pela confiança. E claro, por ter publicado. Só que ainda estou esperando meu exemplar para guardar... Hehehe.
Afinal, é carnaval.
Soube certa vez de uma história. Não importa quem contou e nem porque, mas que achei interessante.
O baile não tinha um título ilustrativo e se deu em um salão que hoje é de terceira idade.
Reza a lenda – e não sei por que não era nascido – que os carnavais de antigamente eram festas em que realmente havia alegria e uma saudável permissividade.
Eram tempos em que havia pierrots, colombinas, arlequins, bailarinas e piratas.
As guerras entre blocos - chamados “corsos” - tinham como armas serpentinas, confetes e bisnagas de água.
Que no máximo o folião poderia sair molhado da festa carnavalesca.
De sério, mesmo, apenas se ficasse de boca aberta e recebesse uma leva de confetes goela abaixo.

Mas dizia da história... Contaram que eles se encontraram dentro do baile, dançaram de forma esquisita que foliões dançam ainda hoje, com os dedos indicadores subindo e descendo ao lado do rosto.
Ele se aproximou sorrindo.
Ela sorriu de volta protocolarmente, não mostrou maior interesse.
Ele vestido de pirata com papagaio de pelúcia preso ao ombro, tapa olho e tudo.
Ela com um bonito traje de arlequim quadriculado em branco e preto. E mascara sobre os olhos.
Dançou-lhe em volta sem lhe tocar ou dizer palavra até o fim da música.
Palavras que nem seriam ouvidas tal a altura e intensidade com que a orquestra atacava a marchinha quando, enfim, se insinuou.

-Mascara negra? – disse ele.
-Sim, para compor com a fantasia...
-Não... A musica que a orquestra tocava.
-Deve ser... Não me atenho a musicas de carnaval.
-Eu gosto, são lúdicas... De letras quase débeis...
-Isso... Por isto não me ligo nelas, apenas danço.
-E lindamente... Devo dizer.
-Que bom que gostou.
-Adorei. Dança a próxima comigo?
-E porque não?

A orquestra que já tocava há quase uma hora sem parar pediu um tempo para se recompor.
Ele resignado sorriu e disse que esperava.
Ela com um semblante mais tenso que o normal para a ocasião consultou o relógio de pulso escondido sob a luva preta da mão esquerda – a direita era branca – e respondeu constrangida.

-Que pena! Não posso esperar, preciso ir.
-Mas é carnaval, que compromisso pode ter?
-Aqueles que máscaras podem esconder, mas não anular... Desculpe.
-Apenas uma dança, a orquestra não deve demorar a voltar...
-Não sei e não posso esperar para descobrir. Fica para o próximo carnaval. – e sorri. -Não sei se vou poder esperar...
-Que pena! – diz ela virando-se para sair quando é segura pelo braço.

Antes que reclame, abraça-a firme e canta: “-Se fosse por mim, todo mundo andava sambando assim nesse passo passando. Porque nada mais bonito que um brasileiro pé duro. Representante da raça, descendo no samba a ladeira da praça.”.

Ela entende o recado e se deixa levar ao centro do salão...
Os outros em volta também entendem abrindo espaço para o pirata e a arlequim.
Sob palmas ajudam em coro: “-E se você merecer, inteira de graça ao ar livre. A fina figura de uma criatura representante da raça descendo no samba a ladeira da praça...”.
-Esta eu conheço! – diz ela continuando – “Presa no espaço e solta no ar, nem andando e nem voando... Só sambando. Descendo no samba a ladeira da praça.”.

Ao fim um rápido beijo, roubado da parte dele e consentido por ela, afinal é carnaval.
Soltou-se do abraço e correu tal qual uma Cinderela a meia noite.
Disseram que o pirata, nunca sequer contou à esposa que já esteve em um baile de carnaval.
Muito menos depois de casado. Diz não gostar.
Sua esposa idem, mas quando se pega pensando no passado lembra de um carnaval em que foi partner de um pirata.
Afinal, era carnaval...

Comentários

Unknown disse…
aaaaah! que lindo!!!! que atmósfera! lí duas vezes, tres vezes, muito lindo cara! cé se supera a cada que leio.
andreh disse…
Eu tinha lido esse texto em outro blog, não me lembro onde, só não conseguia encaixar aqui como te parabenizar, agora posso! MA-RA-VI-LHO-SO! Parabéns Ron!
Marcelonso disse…
Groo,

Seu talento para a escrita é nato, seu dominio das palavras é admirável e sua imaginação é sem limites.

Como sempre disse, um dia quando crescer quero poder escrever assim ...

Parabéns!


abs
Manu disse…
Belíssimo Groo! São textos são ótimos!

Bom fds!
Abs!
Unknown disse…
Encontros marcados pelo "Sr. Destino" em um lindíssimo conto teu meu amor. Quando li a 1ª vez achei (como sempre) que tua imaginação é inacreditável mesmo...rsrsrs.
Tua sensibilidade as vezes me espanta e me comove.
Esta é apenas uma de muitas que serão publicadas.
Você merece reconhecimento, e ELE vai vir.
Tenho um orgulho danado de ti.
Bj
Anônimo disse…
...e M.C., escreve: 2010. Groo. Desculpe-me, tá, mas quero que voce seja um grande escritor e esses caras daí de cima NÃO vão te ajudar ! Tudo bem escrito. aí, sim, lindo ! Mas o carnaval sempre foi "safado" e muitas vezes violento ! Violentíssimo ! Uma mulher, sozinha, num baile de carnaval, e de elite - dar a entender isso -, é suspeitíssimo ! É da Humanidade ! Homem só... "meeenas" mas, no mínimo, estranho. Tá ! " Sonhe, M.C. sonhe...". Está implícito ao texto ! Ele chegou com amigos e ela com ami... " Ela não ! Foi embora como Cinderela ! " As amigas foram pros... cantos escondidos... prá... Umas rapidin... Um bola gato... Foram embora mais cedo, M.C. " ! Sorte que não era, a festa momesca, nos antigos casarões ... As crianças iam para as casas dos avós, casas de campo... Um verdadeiro carnaval ! Agora, o final, surpreendente ! Péralá ! Dois vovôs, ele a ler poemas e ela tricotando ? Qualé, Lelé ? De pirata, é que gosta ! Tá escrito na fantasia ! Gosto de transsssgredir ( não se vista de mulher ! Nunca ! Papo dez de carioca )! Arlequim ? Uma das poucas fantasias que dava prá ver, antigamente, as curvas da moçoila ! Presentezinho: ... http://veja.abril.com.br/saladeaula/151106/imagens/arlequim.jpg ... E umas, bem safadinhas, encurtavam daqui, apertavam dali... Colombina, das antigas, era menos chamativa... Apesar que facilitava certas coisas... Basta desta Commedia Dell'arte tupiniquim ! Tô pensabundando demais ! Mas, duvido, que um casal.. e conheço muitos; gostam de coisas picantes, de vez em quando... falariam sobre, só prá provocar ciúmes um no outro, que seja ... Só não falariam se, já casados, sairam para saracotear no carnaval em diferentes épocas...
Anônimo disse…
e o resto ? e o resto ? Foram dois comentários ! Não dá certo isso aqui !

Vou mi já que é hora, M.C. !
Ron Groo disse…
Foram dois? Mas tinha um só! Escreve de novo.
Fábio Andrade disse…
Eu não sou a Vall e, felizmente, eu não tenho contigo o mesmo tipo de relação que vc tem com ela, mas eu vou roubar a fala da sra. Groo, mas ao meu modo: eu tenho um orgulho filho da puta de você, caralho!

Já te disse que esse texto é lindo e emociona. Parabéns, Groo!